Os veganos no Candomblé
- Filhos do Candomblé
- 21 de jan. de 2019
- 4 min de leitura
Atualizado: 25 de mar. de 2019
Há algum tempo atrás eu me fiz a seguinte pergunta: "Será que existem veganos no candomblé?". Sem ter uma resposta válida, minha cabeca surgiu com outro enigma: "E se existem, como eles vivem com o dilema do sacrifício de animais dentro de sua própria fé?". Continuei sem respostas e quando notei, pensava nisso o dia inteiro e como eu poderia ir ao encontro dessas informações. Foi então que surgiram duas ideias maravilhosas: a primeira foi de encontrar e entrevistar essas pessoas que até então não existiam no meu mundo e a segunda ideia foi a de criar esse blog para poder sempre trazer conteúdos de qualidade e de interesses da comunidade candomblecista.
Para começar esse trabalho, além das entrevistas, achei que caberia aqui uma breve explicação sobre o que é o veganismo e diferencia-lo do vegetarianismo para que a gente não caia no clichê ou até mesmo reproduza informações erradas.

VEGANISMO x VEGETARIANISMO
De uma forma rápida e sucinta vou compartilhar com vocês os principais pontos de diferença entre um movimento e o outro para que possamos linkar essas informações com o que de fato interessa para nós: o candomblé.
O movimento vegano é mais do que um hábito alimentar. Seus adeptos não consomem nada de origem animal como lã, mel e couro. Eles enxergam o veganismo como uma filosofia de vida e respeito a todos os seres vivos. Além disso tudo eles também protestam sobre o uso de animais como experimentos científicos e até mesmo para fins recreativos como as touradas, ringues de animais, dentre outros.
Já o vegetarianista não come certos tipos de carnes, mas continuam fazendo o uso de certos produtos de origem animal como: ovos, manteiga e casacos de pele.
O VEGANISTA E O CANDOMBLÉ
Após a breve explicação sobre o movimento vegano, nós nos deparamos com o claro conflito entre a ética de seguir seus princípios e aceitar sua religião do jeito que ela é, mesmo que o culto, de uma certa forma, agrida seus ideais.
Para aqueles que não sabem, mesmo que pareça impossível alguém não saber disso, o candomblé em seu culto faz o uso de animais para a sacralização de alguns rituais e utilizam a sua carne para a alimentação da sua população.
Para alguns é quase impossível imaginar um vegano se iniciando na religião, por causa de um discurso com uma pitada de preconceito, ao ligar o veganismo a uma "frescura" da pessoa. Mas o que eu descobri conversando com alguns irmãos e irmãs é exatamente o oposto disso, os veganos não buscam mudar o culto e não é a intenção deles alterar rituais tão importantes. O que eu pude perceber foi uma total entrega a sua fé e o discernimento de sua vida pessoal com a religiosa, além do respeito duplicado pelo animal que vai ser sacrificado dentro da casa de santo.
Abaixo colocarei alguns trechos de depoimentos que recebi para que vocês consigam chegar a mesma conclusão que eu.
DEPOIMENTOS:
Mike Meneghetti é iniciado há 29 anos e já faz 5 anos que ele resolveu se tornar vegano. Mike diz que não encontrou barreiras para unir seu estilo de vida vegano com o culto candomblecista e afirma ter total apoio de seus filhos e comunidade. E por fim, ele ainda concluiu: "Pelo Òrìsà faço qualquer coisa".
Matheus é iniciado há 14 anos e é vegano há 6. Ele decidiu optar pelo veganismo após ir a uma vaquejada e ver como os animais eram maltratados antes do evento acontecer. Ele ainda diz que no começo teve dificuldades em conciliar a sua filosofia de vida com a religião: "Cogitei escolher entre o veganismo e o candomblé porque pra mim não fazia sentido ser vegano e do candomblé. Então me culpava por ser vegano e ser de uma religião onde tem o sacrifício animal e do outro lado me culpava por ser do candomblé e pensar em sair por não concordar com os fundamentos na época". Depois de muito pensar o que fazer, Matheus resolveu que conseguiria conciliar suas duas paixões. Dentro da sua casa de santo ele participa de todas as funções e procura sempre respeitar os animais assim como na sua vida pessoal.
Tayane Luciene é iniciada, frequenta o candomblé há 4 anos e é vegana há 3 anos e meio. Tayane diz que às vezes ouve piadas e comentários maldosos sobre ser vegana ditas por pessoas do candomblé, mas que ela consegue equilibrar, sem maiores problemas, a sua alimentação e a sua fé. "Quando eu me iniciei eu tive que comer algumas coisas por conta dos fundamentos, mas era uma coisa que eu já sabia que iria passar antes mesmo de decidir parar com consumo de carne. (...) Eu sei até onde vai o meu limite como yawô e devo seguir os fundamentos e a hierarquia".

Thainá Gelli, é abian há 2 anos e vegana há aproximadamente 9. Thainá, assim como a breve descrição feita acima, enxerga o veganismo não como um estilo de vida e sim como uma filosofia. Dentro do seu barracão a sua família de santo sempre respeitou a sua opção de ser vegana e além disso, se ocorrer a necessidade de sua iniciação, ela encararia tudo com amor e devoção ao orixá. Dentro da comunidade vegana Thainá já sofreu discriminação por ser do candomblé, mas ela não se importa e lida com essa questão com muita sutileza: "Eu apenas abstraio, somente eu sei o que eu sinto dentro do barracão, o que eu sinto do meu santo no meu coração e isso ninguém jamais entenderá de forma plena como acontece. Eu vivo o que o santo me proporciona viver, da forma que é melhor e do meu merecimento aos olhos dele, assim será até quando ele quiser".

Ou seja, após ler todos esses depoimentos magníficos chegamos a conclusão de que os veganos buscam o respeito pelos animais, mas acima de tudo pelos Orixás. Compreendemos também que somos capazes de escolher algo para as nossas vidas, mas que podemos manter nossa fé, amor e dedicação ao sagrado sem ferir quem somos e o que somos.
Gostaria de agradecer a cada um que ajudou na criação dessa linda matéria, principalmente aos entrevistados. E que esse seja apenas o começo de um lindo trabalho colaborativo entre nós Filhos do Candomblé.
Com Axé,
Filhos do Candomblé.
VOCÊ PARECE MAIS SE IMPORTAR COM UMA CRENÇA HUMANA DO QUE COM O DIREITO À VIDA E AO RESPEITO QUE OS ANIMAIS TÊM! AS CRENÇAS HUMANAS PERTENCEM AO SER HUMANO E NÃO AOS ANIMAIS! SE QUEREM OFERECER SANGUE, OFEREÇAM O PRÓPRIO SANGUE E NÃO O DE CRIATURAS QUE NÃO ESCOLHERAM SER IMOLADAS POR CAUSA DA SUA CRENÇA! SACRIFICAR ANIMAIS EM NOME DE ENTIDADES INVISÍVEIS É TÃO IMORAL QUANTO O RODEIO, A VAQUEJADA E AS TOURADAS!!! O VEGANISMO DEFENDE ACIMA DE TUDO O ABOLICIONISMO DO HOLOCAUSTO ANIMAL, ISTO É, LIBERTAR OS ANIMAIS DA TIRANIA HUMANA! SE FOR POR ISSO, EXISTEM RELIGIÕES QUE SACRIFICAM OUTROS SERES HUMANOS PARA OS SEUS DEUSES! INCLUSIVE A RELIGIÃO YORUBÁ ORIGINAL, QUE DEU ORIGEM AO CANDOMBLÉ, FAZIA…
Me senti totalmente abraçado por essa matéria. Sou iniciado no candomblé, babá egbé de uma casa de orisa, e graças aos ancestrais (ler-se orisas), consigo viver totalmente tranquilo com a questão da sacralização que ocorre, quando necessário na minha casa, e também componho uma casa na qual compreendemos que os animais só são usado em situações extremamente necessária, e usamos muito dos conhecimentos de ossain para evitarmos uso do sangue animal, mas é uma conversa muito profunda para discorrer aqui. Contudo, fiquei encantando por achar essa matéria. <3
Estou na transição para o veganismo há mais de um ano e agora no momento mais firme da transição, voltei ao candomblé numa casa até compreensiva. Mas ainda tenho meus receios e estou a procura de veganos do candomblé para troca de experiências. Meu insta @cernuno.
amei💕👏🏾👏🏾👏🏾👏🏾
Que trabalho bonito!!! Mtas bençãos!! 😉❤️